Saturday, September 05, 2009

O servidor

- Não tenha pressa, José, não tenha pressa de morrer.
Seja bravo, José, tenha fé.

Aqui e acolá a mulher de José, Maria, repreendia o marido pela falta de amor próprio.
José é servidor público, um súdito de um sistema que nasceu pra dar errado.
Como um Leão, ele foi domado, a duras penas aprendeu a obedecer, baixar a cabeça e ficar calado.
E assim foi os, até agora, 30 anos de serviço.

Aos 58 anos de idade, com quatro filhos e dois netos, José, conta os dias para sua tão sonhada aposentadoria.
Era a luz no final do túnel, tal qual mostraria um novo caminho, saindo da cegueira e ingressando na felicidade da visão.

Parabéns pra você, nesta data querida...

- Feliz aniversário, José. - Todos lhe cumprimentavam.

Quando o silêncio tornou-se notório, José chorou.
Com as mãos trêmulas lembrou-se das angústias que passou a vida inteira.
Desabrochou o sentimento de perda.
Um sentimento que grita em seu peito, urgindo para um horizonte transcendental.
José perdera o medo de morrer.
Mais do que isto, não tinha mais motivações para viver.
Passou a vida inteira se dedicando aos outros, servindo a demônios e hoje sua alma tornou-se independente.
Um hoje desconhecido, como uma imagem que deprecia a idéia de destino.
Ele possui o controle.

- Não deixarei que o stress cotidiano acabe com minha vida, não deixarei que a velhice acabe com minha vida, não deixarei que outrem acabe com minha vida.

E com estas palavras, José, pulou do décimo quinto andar no prédio onde morava com sua família.
Morreu com a certeza que dominava, ao menos, o seu tempo.